Negociação: Armadilhas Psicológicas

Não caia nesse jogo!

Sempre trabalhei com vendas e por todos os cargos que passei, sempre recebi uma grande carga de informação sobre técnicas de negociação. Acontece que sempre tive uma certa aversão a esse conceito, afinal, me parecia que se alguma técnica de convencimento fosse necessária, o foco teria deixado de ser a melhor solução possível para ambos e passaria a ser obter a maior vantagem possível para mim.

Essa percepção me deixava aflito, não apenas por tratar-se de algo que eu não via com bons olhos, mas também porque compreendi que eu poderia ser vítima de uma dessas técnicas. Além disso, meu trabalho exigia, cada vez mais, atuação em situações que a negociação ditava o ritmo dos negócios.

E claro que tais técnicas não se restringem ao ambiente corporativo, a negociação está presente no cotidiano de todos, desde a interação mais básica às mais complexas. Seja escolhendo o próximo destino de uma viagem com seus filhos, seja discutindo a melhor posição dos móveis na sala ou pedindo um aumento para o chefe, você está sempre negociando.

O fato de estar exposto a técnicas de negociação em tantos aspectos da minha vida, além de me deixar mais mais atento, aguçou minha curiosidade sobre o assunto. Esse post é um compilado de teorias, pesquisas, observação e vivências, que acredito serem as mais evidentes armadilhas psicológicas de negociação.

O primeiro ponto a ficar claro é que uma técnica de negociação nem sempre é baseada em argumentos treinados. Muitas vezes, são formadas por um conjunto de conceitos que foram aprendidos por tentativa e erro, sem que a pessoa sequer se desse conta, ou seja, fora armazenada de maneira inconsciente em sua mente.

Discurso

Uma das armadilhas de negociação mais antigas são as Falácias, aqueles truques de diálogo que parecem verdadeiros, mas, na verdade, distorcem a realidade, induzindo ao erro e fazendo com que o outro lado não tenha muitos argumentos para debater. A forma mais eficiente de combater essa técnica é conhecê-la, então, seguem alguns exemplos abaixo (para mais informações sobre esse assunto, acesse aqui):

  • Post hoc ergo propter hocAssume que uma única correlação é prova suficiente da causa (depois disso, logo, por causa disso). Também conhecido como Correlação Coincidência. Ex. “As vendas caíram após o anúncio do aumento do dólar. Portanto, nosso negócio também depende da flutuação da moeda”.
  • Falso Dilema – É dado um argumento que limita as opções, dessa forma, a “vítima” se vê presa em um dilema. Ex. ” Ou você quer o impeachment da Dilma ou você é Petista“.
  • Ad ignorantiam – Cria uma condição falsa àquilo que não pôde ser provado como verdadeiro ou entende como verdade algo que não pôde ser provado falso. Ex. “Sou inocente até que se prove o contrário

Persuasão

Existem algumas técnicas que se aproveitam de uma característica do cérebro humano, que é a busca por atalhos. Um dos maiores especialistas no assunto, Robert Cialdini, define esse viés como “um padrão rígido de comportamento, desencadeado por características isoladas da situação“. Ou seja, algumas situações induzem o comportamento humano, “permitindo ao indivíduo decidir uma linha de ação sem ter que analisar, de forma minuciosa e completa, cada uma das informações“.

Isso pode ser ótimo para que nosso cérebro poupe energia, tempo e capacidade mental, mas nos deixa vulneráveis a erros de interpretação, o que é uma grande desvantagem quando se fala em negociação. Tudo piora quando as outras pessoas aprendem as regras sociais que desencadeiam atalhos para certos comportamentos e passam a estimulá-los de acordo com seu interesse. Cialdini cita 6 principais exemplos dessas regras:

  1. Reciprocidade –  A regra diz que um indivíduo precisa retribuir, na mesma moeda, o que outra pessoa lhe ofereceu. Essa sensação de obrigação futura faz com que fiquemos expostos a decisões irracionais.
  2. Compromisso e Coerência – Os psicólogos reconhecem um desejo na maioria das pessoas de serem e parecerem coerentes com suas palavras, crenças, atitudes e ações. Isso pode fazer com que você queira manter sua posição ou palavra, mesmo percebendo que esteja errado.
  3. Aprovação Social – Poderosos efeitos imitativos foram encontrados entre crianças e adultos. O princípio da aprovação social pode ser usado para estimular o consentimento de uma pessoa a um pedido, informando a ela que vários outros indivíduos concordam com aquela situação.
  4. Afeição – As pessoas preferem dizer “sim” a indivíduos que conhecem, gostam, admiram ou se parecem.
  5. Autoridade – Existe uma tendência preocupante em reagir automaticamente a meros símbolos da autoridade e não ao seu conteúdo. Títulos, roupas e automóveis são os símbolos que mais desencadeiam a percepção de autoridade.
  6. Escassez – De acordo com o princípio da escassez, as pessoas atribuem mais valor a oportunidades que estão menos disponíveis. Já discutimos essa regra aqui.

Pressão Psicológica

Existem negociadores que insistem em explorar as fraquezas psicológicas para tentarem obter vantagem. Roger Fisher e Willian Ury, em seu o livro Como Chegar ao Sim, elencam essas armadilhas de forma clara e objetiva.

Uma das mais comuns é tentar criar algum tipo de pressão psicológica com o Ambiente escolhido para negociação. Pode ser uma sala de reunião pomposa, em um prédio luxuoso, no melhor bairro de sua cidade, para que você se sinta inferior ou desencadeie a regra da afeição. Um exemplo claro (e quase nunca declarado) é a cadeira do chefe ser maior ou estar em local elevado (aí fica mais difícil pedir aquele aumento) desencadeando o viés de autoridade.

Os Ataques Pessoais são armadilhas mais comuns do que se imagina, porque são feitos de maneira muito sutil. Um atraso proposital, mostrando ao outro lado que não se importa muito com aquela negociação, um comentário sobre o tamanho de sua empresa ou seu currículo são exemplos desses ataques.

Uma variação dessa armadilha é muita conhecida pelos fãs de filmes, “Bad Cop, Good Cop”. O Esquete de Mocinho e Vilão parece muito clichê, mas ainda é tido como técnica de negociação por alguns “profissionais” do ramo. Trata-se de uma encenação em que um dos negociadores faz ataques pessoais e se mostra mais duro, enquanto o outro tenta ativar o atalho da afeição.

Apelo

Alguns exemplos de apelo ou barganha posicional, que visam apenas a concessão do outro lado, certamente, é do conhecimento de todos, afinal, a ficção explora bastante essas técnicas:

  • Recusa em Negociar – quando o negociador mostra sua posição e alega ser a palavra final (chamo essa de “o menino mimado”).
  • Demandas extremas – quando o negociador inicia com uma proposta extremamente abaixo do que o objeto em questão realmente vale e faz pequenas concessões durante a negociação (essa é velha).
  • Demandas crescentes – quando o negociador aumenta seu preço a cada tentativa de negociação da outra parte, pressionando-o a decidir rápido na tentativa de ativar o viés de escassez (o mais chato de todos).
  • Tática do entrincheiramento – quando, por exemplo, um líder de sindicato diz em público que espera obter 15% de aumento de salário para os funcionários antes de negociar com a empresa. Ele tenta deixar o outro lado sem saída, mas corre grande risco de perder credibilidade (o famoso blefe).
  • Parceiro invisível – quando um negociador não faz concessões, alegando que seu chefe, sócio ou seja lá quem for, não aceita discutir os termos (peça para falar com quem decide e acabe com essa armadilha).
  • Atraso calculado – quando o negociador adia ao máximo a decisão esperando que o outro lado faça concessões (um clássico).
  • Pegar ou largar – quando o negociador não se mostra disposto a entrar em um debate e exige uma resposta imediata (argumento de feira).

As armadilhas do discurso, persuasão, pressão psicológica ou apelo são técnicas que podem ter sido articuladas anteriormente, de maneira consciente, ou apenas vícios aprendidos com a experiência. Sua principal arma para se livrar delas é aprender a identificá-las para não ser induzido ao erro.

Minha opinião sobre a melhor técnica é que devemos parar de encarar a negociação como uma disputa em que um lado perde e o outro ganha. Devemos nos concentrar nos interesses que estão em jogo. Inove, crie opções para que ambos os lados consigam receber valor pelo que foi negociado.

Seria um caminho muito mais fácil e eficiente se todos pensassem assim. A realidade é que você ainda vai se deparar com muitos espertalhões, mas agora você já pode se desviar das armadilhas.

Referências: As Armas da Persuasão, Robert B. Cialdini, 2009. Como Chegar Ao Sim, Roger Fisher e Willian Ury 1981

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